Luiz Sayão
É fato conhecido que um dos pioneiros do rock nacional, que
fez muito sucesso há cerca de três décadas, foi o controvertido Raul Seixas.
Numa mistura de protesto e busca por respostas para a vida, o conhecido
“Raulzito” causou a mais diversificada reação em todo o país.
Pouca gente sabe que o falecido roqueiro conheceu o
Evangelho de Cristo. Chegou até mesmo a ter um filho com sua primeira
companheira, que era filha de um missionário norte-americano. Todavia, a
perspectiva panteísta e agnóstica de Raul Seixas mostrou que o famoso cantor
não abriu o coração para a mensagem do Evangelho. Sua morte não deixa dúvidas
sobre isso!
Por incrível que pareça, se Raul Seixas não se deixou
influenciar pelas boas novas de Jesus, parece-me que suas idéias estão cada vez
mais presentes na realidade evangélica contemporânea. Será possível que estamos
caminhando para uma “teologia do Raul Seixas”? Será que teremos um evangelho
“maluco beleza”? O amigo leitor pode dar sua própria opinião.
Enquanto as Escrituras deixam claro que existe apenas um
Deus verdadeiro, que está acima de sua criação (Is 44.6; Rm 1.18-21), a
perspectiva panteísta aparece expressa na música “Gita”, de Raul. Ele
afirmava:
“Eu sou a luz das estrelas /
A mãe, o pai e o avô /
O filho que ainda não veio /
O início, o fim e o meio.”
Este enfoque tenta tirar de Deus a glória que só Ele tem e
merece. De modo geral, o panteísmo que deifica a natureza acaba definindo como
categoria suprema o fluxo do movimento. Heráclito sorriria no túmulo. Tais
idéias, muito presentes nos filmes norte-americanos mais populares, parecem
emergir do conceito de que Deus é uma energia, “um fluir” (unção?). Em certos
redutos evangélicos já se pode perceber que Deus se tornou “um poder
manipulável” por “comandos determinadores”. Além disso, o enfoque da teologia
do processo, que já nos influencia com todos os seus desdobramentos
específicos, também diminui Deus e o coloca sob o domínio do “fluxo do tempo”,
sugerindo que Ele é apenas nosso sócio na construção da história.
METAMORFOSE AMBULANTE
A idéia da supremacia do fluxo do tempo desemboca na
rejeição de outras categorias fixas. A única categoria é o próprio tempo, o
novo senhor absoluto. Com esse pressuposto, já não podemos ter teologia e ética
definidas e claras. Embora a Bíblia seja um livro de orientações muito
cristalinas sobre Deus, a salvação e o propósito da vida (2 Tm 3.16,17; 2 Pe
1.19-21), para muitos evangélicos, a teologia “maluco beleza” é preferível.
Como diria Raul:
“Eu prefiro ser esta metamorfose ambulante /
Do que ter aquela velha opinião formada sobre
tudo.”
Se uma opinião for antiga, deve ser rejeitada! Há uma crise
doutrinária e teológica em boa parte do meio evangélico. Muitas pessoas adotam
hoje idéias liberais, místicas e extremistas sem a devida avaliação. Nesse
caso, não importa sua fundamentação teológica, histórica e lógica. Viva a
metamorfose!
Tal sensação de indefinição, presente no pensamento do
roqueiro tupiniquim, ajudou a formar seu perfil estranho, controvertido e até
mesmo bizarro. Não é que um grupo significativo de evangélicos também já tem se
aproximado do esdrúxulo?! Há um certo desprezo pela reflexão, pela teologia, e
o crescimento de práticas risíveis e simplesmente inacreditáveis. Será que
podemos ouvir o eco da música de Raul ao contemplar grande parte do chamado
meio evangélico atual? Será que estamos diante do
“Contemplando a minha maluquez /
Misturada com minha lucidez”?
Até onde vai a nossa “maluquez”? Será que voltaremos à
lucidez? Será que muitas reuniões religiosas de hoje estão nos deixando, “com
certeza, maluco beleza”? Espero que essa sensação seja um exagero! Todavia,
temo que não seja!
Não faz tanto tempo assim, os cristãos evangélicos entendiam
que um culto de adoração a Deus tinha, de fato, Deus como o centro do culto.
Muitos cânticos tinham letra elaborada, teologia saudável e enfatizavam os
atributos e os atos de Deus. No entanto, em algumas reuniões dominicais de
hoje, temo que o foco esteja sendo mudado. Novas canções falam de um amor quase
romântico e indefinido, divertem a massa, exaltam unção, montanhas, Jerusalém,
guerra etc. O conceito de dedicar o domingo para uma diversão sem propósito e
finalidade bíblica é manifesta na teologia do Raul Seixas. Como ele mesmo
dizia:
“Eu devia estar contente pelo Senhor ter me concedido
o domingo
para ir ao jardim zoológico dar pipocas aos
macacos”.
Será que já podemos observar “uma fauna evangélica com suas
macaquices litúrgicas”? Tomara que não! Espero que tudo que escrevo não passe
de uma análise exagerada! Todavia, temo que não.
Como todo enfoque teológico, o pensamento do “teólogo-músico
pós-ortodoxo” nacional, também possui as suas decorrências de ordem prática.
Não há como fugir da realidade. A forma de pensar e ver o mundo influencia e
determina a vida prática de qualquer pessoa. A verdade é que se adotarmos uma
base panteísta, um pensamento relativista, uma ética indefinida e práticas
místicas emocionalistas sem conteúdo, não chegaremos a lugar nenhum. E não é
que o “grande teólogo-roqueiro” já sabia disso! Quem pode lembrar de sua
“perspectiva teleológica” que determinou seu trágico fim?
“Este caminho que eu mesmo escolhi /
É tão fácil seguir/ Por não ter onde ir.”
Se a igreja evangélica brasileira desvalorizar a doutrina
bíblica, desprezar a teologia, deixar de lado a ética e afundar-se no
misticismo e nas novidades ideológicas frágeis, logo ela descobrirá que esse é
um caminho “tão fácil de seguir”. O grande problema é que no final das contas
“não teremos para onde ir”.
Mais do que nunca, precisamos desesperadamente voltar nossa
atenção para as Escrituras Sagradas, com o verdadeiro desejo de obedecer a Deus
e à sua verdade. Que Deus nos abençoe.
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